segunda-feira, 10 de março de 2008

d. João VI, Domingos Rodrigues e a Cris-crítica


D. João VI, por Sendim (1825), Biblioteca Nacional

Os leitores já, já vão entender o título deste post. Primeiramente, vamos à notícia. A comemoração dos 200 anos da chegada da família real ao Brasil virou tema da 5ª edição do Rio Bom de Mesa, festival que reúne de amanhã até o dia 15/3 14 restaurantes da cidade sob a bandeira da Associação da Boa Lembrança. A lista lá embaixo relaciona as casas participantes, que terão, também, chefs convidados de várias partes do país. Cada um deles prepara pratos inspirados num antigo livro de receitas português chamado Arte de cozinha (para quem acompanha este blog, este nome não soará estranho). Como é de praxe, quem comer o prato do festival leva o dito cujo de cerâmica, pintado à mão. Neste ano, os colecionadores destes pratos de cerâmica ganham a imagem de D. João VI com o Rio ao fundo - e aí está o primeiro nome do título deste post.

Arte de cozinha (edição de 1758)

O que me chateia — e justifica a Cris-crítica do título (cópia descarada de uma das seções do guia do Estadão, que adoro) — é a divulgação de informações equivocadas que fazem com que essa celebração mostre, pelo menos pra mim, sua face mais tristonha: a de que continuamos reféns de nossa (falta) de história. Ou, melhor dizendo, de nosso desconhecimento da própria história.

Explico: o release que recebi sobre este evento, e que está proliferando em toda a imprensa e pela internet, diz que os pratos serão inspirados em receitas do livro Arte de cozinha, escrito por Domingos Rodrigues. Domingos Rodrigues, continua o comunicado, era cozinheiro de D. João VI e o livro, datado de 1794. Há erros graves nestas poucas linhas (e eu ainda nem vi as receitas...).

O primeiro deles é que o livro Arte de cozinha não data de 1794. Para quem lê, fica-se a impressão de que é uma obra única, escrita neste ano e pronto. Arte de cozinha é o primeiro receituário impresso português de que se tem notícia; e foi editado pela primeira vez mais de 110 anos antes - seu primeiro volume é de 1680 e o livro teve 19 edições ao longo de quase 170 anos.

Daí, vem a segunda e pior afirmação que está correndo solta: a de que Rodrigues era cozinheiro de D. João VI. Não é preciso nem fazer conta para perceber a impossibilidade desta afirmação. O que me deixa triste é que, quem quer que tenha sido o autor dessas informações, sequer fez uma breve pesquisa sobre o referido cozinheiro. E não precisava nem deparar com meu livro (que tem o mesmo nome do receituário de Rodrigues), nem com edições produzidas em Portugal para saber um pouco mais deste que é um dos mais importantes livros antigos de cozinha da Península Ibérica.

Um rápido Google com as palavras-chave "domingos rodrigues" e "cozinheiro" oferece, de cara, informações sobre sua morte (1719) e sobre o rei D. Pedro II (irmão de D. Afonso VI), que governava em sua época e para quem, presume-se, ele trabalhou. Uma busca um pouco mais específica, somando o nome do receituário e o de seu autor, traz entre os primeiros links um precioso livro, editado pela Biblioteca Nacional de Portugal, que relaciona uma centena de obras culinárias antigas - com autoria, data de edição e capas antigas. Ou seja, coisa de minutos.

Não vou entrar no mérito das implicações que uma obra como esta, reimpressa e reeditada nos séculos XVII, XVIII e XIX, que sai de Portugal e chega ao Brasil e que conta com diversas edições, teve na história de alimentação (lembrando que este evento dos 200 anos é de caráter histórico). Concordo que isso é coisa pra historiador - embora não seja nada mal explorar este livro num evento que faz referência a uma data quase tão importante quanto os 500 anos de "descobrimento" do Brasil. Mas informação errada é difícil de digerir.

E pra não virar "cris-chata", dou a lista de restaurantes que participam do festival e, no próximo post (porque já é madruga), uma palhinha sobre o importante cozinheiro e seu Arte de cozinha.


Borsalino (21/2491.4288)
Carême Bistrô (21/2226.0085)
Casa da Suíça (21/2252.5182)
Emporium Pax (21/2559.9713)
Esch Centro (21/2507.5888)
Esch Leblon (21/2512.5651)
Giuseppe (21/2509.7215)
Margutta (21/2259.3887)
Bistrô Montagu (21/2493.5966)
O Navegador (21/2262.6037)
Rancho Inn (21/2263.5197)
Sagrada Família (21/2252.2240)
Sushi Leblon (21/2274.1342)
66 Bistrô (21/2266.0838)

Alguns chefs convidados:
Adriana Didier (Beijupirá - Porto de Galinhas)
Cesar Santos (Oficina do Sabor – Olinda)
Ivo Faria (Vecchio Sogno – Belo Horizonte)
Marcos Sodré (Sawasdee - Búzios)
Zeca D’Acampora (Bistrô D’Acampora – Florianópolis)

domingo, 9 de março de 2008

ao desavisado, as batatas


Istockphoto
Sexta-feira fui jantar com meu amigo mexicano Jose Cleofas, juiz de campeonatos de barista pelo mundo e que me ensinou, depois da Isabela Raposeiras, como degustar e, melhor, se comportar diante de uma xícara de espresso. Fomos ao A Figueira Rubaiyat, restaurante em que sempre comi bem. Aproveitei para pedir o aclamado tropical kobe beef, que ainda não havia provado. Dei azar naquela noite tão agradável. Precisei pedir 3 vezes para que, finalmente, uma garrafa d'água chegasse à minha mesa (e havia, pelo menos, dois garçons que pareciam não sair de perto de nós). Se fosse só isso, tudo bem. Acontece que o tal afamado prato, que custa R$ 110, não veio a contento. E não pela carne, que estava deliciosa, derretendo de tão marmorizada. As batatas-suflê - aquelas infladinhas, difíceis de fazer -, que deveriam murchar na boca, vieram torradas como batata chips. Repito: o prato custa R$ 110. Tem que vir perfeito. Solicitei a troca - das batatas, não do prato. A segunda leva veio idêntica. Percebendo o meu desgosto, os garçons tentaram ainda uma terceira vez. A nova rodada não estava perfeita, mas pelo menos não esfarelava na boca. Fiquei pensando que, talvez, a casa de Madri venha ocupando demais a vida de Belarmino Iglesias, dono do belíssimo restaurante. Porque não consigo imaginar porque as batatas ficariam de mal de mim naquele dia.

quinta-feira, 6 de março de 2008

nova Menu já está nas bancas


Para os que ainda não sabiam da novidade - porque eu sumi - eis o motivo do "abandono temporário" deste blog. Marcelo Katsuki, querido, assim que viu a nova Menu já deu a notícia no seu blog! Espero que gostem da nossa nova revista.

Publicação da Editora 3, com novo logo, passa a ter lombada quadrada e maior alcance de olho em novos leitores

Renato Pezzotti, do Meio & Mensagem
28/02

A equipe da Menu, que está de cara nova A Menu, publicação da Editora 3 especializada em gastronomia, comemora seus dez anos de vida com cara nova. Com logotipia reformulada, a revista passa a ter mais páginas e lombada quadrada na busca de mais leitores. "Agora teremos como proposta apresentar uma revista que entre no mundo da gastronomia, com grandes matérias que também disponibilizem receitas para nossos leitores", explica Suzana Barelli, diretora de redação da publicação.

A edição de março já está no novo formato. Segundo José Bello, diretor nacional de publicidade da editora, "a mudança é estratégica para ampliar o alcance da publicação". A revista, que de acordo com dados do IVC de novembro de 2007 conta com cerca de 26 mil assinantes, terá no próximo mês uma estrutura de 82 páginas, sendo 20 páginas destas de publicidade.

Suzana - que foi, nos últimos quatro anos, da concorrente Prazeres da Mesa, de onde saiu como redatora-chefe - ainda conta que a revista pretende se firmar como uma publicação que 'forme opinião'. Para isso, contará ainda com seções fixas, como Notícias, Produtos Orgânicos e Etiqueta, além de oferecer duas novidades aos leitores. A primeira será o selo 'Menu Brasil', com matérias focadas em produtos nacionais. Já 'Romeu e Julieta' mostrará as visitas de um casal a restaurantes para mostrar suas impressões sobre a qualidade do que vai à mesa.

"A revista passa a alcançar novos leitores, que buscam mais serviços. Além disso, a lombada quadrada leva glamour à publicação, que poderá ser colecionada de forma mais fácil pelos leitores e assinantes", finaliza a diretora de redação.

domingo, 2 de março de 2008

frase do (meu) dia, com saquê



Estou na difícil tarefa de estudar, para a faculdade, como filósofos, matemáticos e outros pensadores definem verdade, experiência sensível, conhecimento e linguagem e as relacionam ao mundo da ciência. Para aliviar, um copinho de saquê gelado 1) porque ninguém é de ferro; 2) em homenagem ao meu amigo Marcelo Katsuki, que fez, ontem, mais um de seus concorridos jantares dedicados aos leitores de seu blog e aos amigos prá toda "janta" (!) num restaurante da Liberdade, o Taizam (o cardápio está abaixo).

Uma frase de todo esse estudo (que um dia desembocará, deus é pai, no meu tema preferido que é a comida, ops, "alimentação") vale reproduzir:

"Duvidar de tudo ou acreditar em tudo são duas opções igualmente cômodas: uma e outra nos dispensam de refletir"
Poincaré, na introdução de A ciência e a hipótese, 1902

Enquanto essas relações não se estabelecem, segue o cardápio do jantar do Kats:
repolho salteado na wok com molho de miso, tofu defumado, carne e pimentões
frango frito com molho de gengibre
arroz
bananas carameladas
capirinha de saquê, água e refrigerante