sexta-feira, 25 de julho de 2008

Lei seca


istockphoto
A partir de 1º de agosto, a Casa do Saber de Higienópolis (SP) vai sediar um curso sobre história e bebida, chamado "Histórias de Beber". Gosto dos cursos de lá, já fiz três deles: 2 em Filosofia e um sobre alimentação, sobre o qual já comentei nesse blog. Quando se trata de história da alimentação, sou um pouco cri-cri, pois é meu métier. De qualquer modo, os professores que darão esse próximo curso são historiadores de formação - Flávia Galli é pesquisadora em história cultural, e Leandro Karnal, bastante conhecido, é doutor em história social. Pode ser um bom programa para as sextas-feiras de lei seca. Como o horário é inviável para que eu vá e faça minha apreciação, convoco quem estiver interessado a dar seu parecer.

Programa

1º de agosto: O vinho, na história e na arte
5 de setembro: Uma viagem ao universo do Champagne
3 de outubro: As terras altas da Escócia e o uísque

Casa do Saber (rua Itambé, 315A, Higienópolis, São Paulo. Inscrições pelo 11/3707-8900)
Quando: às sextas-feiras, às 19h30
Quanto: R$ 120 por encontro ou 2 parcelas de R$ 160 pelas 3 aulas

domingo, 20 de julho de 2008

Às batatas


Carl Warner
Tempos atrás, tive o prazer de rever e de trabalhar de novo com a Heloísa Bacellar, da escola de cozinha Atelier Gourmand (SP). Se há receitas que não tem erro, são as dela. Entre as receitas das festas aqui em casa sempre comparecem as da Helô, como um maravilhoso e simplérrimo pudim de claras (já chegaram a reclamar que eu precisava variar a sobremesa, pois é uma das minhas preferidas). Enfim, estava fuçando seu livro (Cozinhando para amigos, DBA, 2005) atrás de uma receita de batatas. Achei esta:

Batatinha grelhada e molhinho blue cheese
Por Heloísa Bacellar

Ingredientes


150 g de queijo gorgonzola ou roquefort
1 cebola em cubinhos bem miúdos
1,5 colher (sopa) de mostarda Dijon
1,5 xícara (chá) de iogurte natural
1 xícara (chá) de folhas de salsinha bem picadinhas
1/2 xícara (chá) de azeite
1,5 kg de batatinha miúda e uniforme, lavada, com casca
azeite, sal e pimenta-do-reino a gosto

Preparo

Na própria tigela de servir, esmague o queijo com um garfo, junte a cebola, a mostarda, o iogurte, a salsinha e a xícara de azeite. Acerte o sal, a pimenta e reserve.
Dobre um pedaço de 1 cm de papel-alumínio para marcar a linha do meio, abra e estenda sobre uma superfície lisa.
Espalhe a batata sobre uma das metades do papel, polvilhe sal e pimenta, regue mais azeite, misture, cubra com a outra metade e feche o pacote, virando as bordas para dentro e dobrando-as mais uma vez, depois coloque sobre a grelha aquecida.
Aguarde 30 minutos, ou até o papel estufar, então abra o papel com cuidado para não se queimar com o vapor e deixe as batatinhas descobertas no fogo por mais 10 minutos, até que estejam ligeiramente douradas e macias (teste espetando com um garfo.
Transfira-as para uma tigela com o molho e sirva (ou coloque as batatinhas numatigela e o molho, em outra).

rendimento 4 porções
tempo de preparo 1 hora

sábado, 19 de julho de 2008

Frases-cérebro



"Entre sopa e amor, a primeira é melhor"
Antigo provérbio espanhol (?), também atribuído a Thomas Fuller (1654 - 1734), médico inglês

Ópera do café


Rogério Voltan/Revista Menu
As pessoas costumam me perguntar qual é o melhor café brasileiro. Guardadas as devidas proporções, passo pela mesma situação dos especilistas em vinhos, que devem ser obrigados a escolher um entre tantas centenas de rótulos que marcaram cada momento de suas peregrinações etílicas. Não existe o melhor café - de qualidade, bem dito -, mas tantos quantos é possível fazer nos diversos terroirs brasileiros, com bom uso de tecnologia do campo à torra, com critério e bom gosto na elaboração de blends. Portanto, respondendo à pergunta, eu gosto de diversos, cada um preparado de um jeito (coado, em máquina de espresso), para um determinado momento do dia. Recentemente provei um de extrema delicadeza, com notas altas de acidez - que é, como me ensinou a tempos a barista Isabela Raposeiras, uma dos critérios de qualidade de um café — e boa doçura (outra dessas qualidades). É o Eurídice, da Fazenda Sertãozinho, que veio fazer companhia ao já excelente Orfeu. Em maio, um pouco antes da colheita, visitei pela segunda vez a fazenda para conhecer um pouco mais deste café para a revista Menu. É o trabalho rigoroso, cuidadoso e repleto de carinho do casal Zé Renato e Ana Cecília, responsáveis pela fazenda do empresário Roberto Marinho, que se vê na xícara. Pois se no mundo do café a máxima dos vinhos se aplica — de matéria-prima ruim nunca sairá um bom produto — é bem verdade que muitos conseguem destruir uma boa matéria-prima e transformá-la em rótulos medíocres, ou em cafés medíocres. Quem bom que não é o caso deste e de outros tantos cafés que podemos beber por aqui.

Na mitologia e na ópera, a lira de Orfeu encantava animais e aves, e as árvores curvavam-se para escutar o talentoso músico e poeta grego. Na Fazenda Sertãozinho, o centenário jatobá que se ergue diante das plantações de café curva-se agora também diante de Eurídice, a companheira de Orfeu. Eurídice é o mais novo café especial produzido pela Sertãozinho, localizada em Botelhos, no sul de Minas Gerais. Lançado no final do ano passado para fazer companhia ao premiado Orfeu, a primeira marca da fazenda, o Eurídice ainda é produzido em pequena escala, e encontrado em não mais do que uma dezena de restaurantes paulistanos e mercados gourmets. "As pessoas pediam um café mais suave e delicado", explica José Renato Gonçalves Dias, diretor da Sertãozinho, de propriedade de Roberto Irineu Marinho, presidente das Organizações Globo.
Além de ser mais uma boa novidade no crescente mercado de cafés brasileiros, o diferencial do Eurídice é que ele não é um blend, como o Orfeu e quase todas as marcas disponíveis nas prateleiras. Com acidez mais acentuada (característica presente somente nos melhores cafés do mundo) e corpo mais suave do que o Orfeu, o Eurídice é um varietal, feito com uma única variedade de grãos. Esses grãos provêm ainda de um só talhão - denominação para um lote de terra com uma única variedade e plantada num determinado ano - num exemplo típico de como o terroir pode expressar suas características nos grãos de café.
Os grãos do Eurídice estão plantados a 1.280 metros de altitude, na região mais alta da fazenda (a altitude confere mais aroma e acidez aos grãos). Além do terroir, outros fatores interferem na excelência da bebida, como a variedade utilizada e o processamento dos grãos. O catuaí amarelo, com o qual é feito o Eurídice, é uma variedade arábica mais doce do que as vermelhas. A fazenda também investe num sistema de adubação que não utiliza um composto com cloreto de potássio, substância que inibe uma das enzimas que contribuem para a qualidade do grão. Depois de adotada esta nova técnica, o café Orfeu conquistou o primeiro lugar numa das edições do concurso de Cafés Naturais do Brasil - Late Harvest, competição de alcance internacional, do qual participam cafés secos lentamente ao sol e que, por isso, originam bebidas mais encorpadas.
Outra característica que confere particularidades a um determinado café é a maneira como ele é processado. "No Eurídice, parte dos cafés são despolpados", explica Dias. Esse processo, que retira a polpa, torna o sabor mais suave e acentua a acidez dos grãos. Os cafés da América Central, como Jamaica e Costa Rica, são processados assim. Com o Orfeu, o Eurídice compartilha de outros atributos, como a rastreabilidade e a idade da lavoura (são usadas apenas lavouras antigas, com mais de 30 anos). Os frutos são 100% secos lentamente ao sol, o que lhes confere mais complexidade e doçura. Esses parâmetros de qualidade, antes de serem endereçados ao mercado interno, já existiam nos cafés da fazenda vendidos no exterior. Se na lenda Orfeu ficou sem sua amada, no mundo dos cafés ele ganhou uma parceira à altura.


Publicado na revista Menu, na edição de junho/2008

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Alice no país das maravilhas




Sempre apreciei os desenhos de plantas e seus detalhes taxonômicos quando estudei botânica na faculdade. Agora, gosto de saber também um pouco da história das plantas comestíveis. Procuro transmitir um pouco daquilo que leio nos textos que faço sobre ingredientes na Menu, numa seção chamada "Tá Fresquinho". A revista de junho já está no site, e reproduzo aqui um textinho sobre cogumelos, além de uma das 3 receitas do chef Sauro Scarabotta, do Fricóo, que publicamos na edição. Para ilustrar, um desses desenhos de que falei, contido na obra do alemão Franciscus van Sterbeeck, "Theatrum fungorum oft het tonneel der campernoelien", de 1712 (Fonte: http://www.biolib.de/)

Em 1873, Alexandre Dumas registrou em seu Grande Dicionário de Gastronomia: "Nada me assusta mais do que a aparição de cogumelos à mesa". Embora eminente gastrônomo, o autor de Os três mosqueteiros temia morrer envenenado ao ingerir aquilo que definiu como "planta esponjosa, sem ramos e sem folhas". O receio de Dumas vinha de longe. Já na Idade Média, os médicos classificavam os cogumelos como alimentos frios e úmidos, não recomendados para a saúde. De fato, muitas espécies silvestres desses fungos são venenosas (como a Amanita muscaria, um cogumelo de chapéu vermelho com manchas brancas), e é preciso experiência para não colhê-las por engano. Mas a maioria é ingrediente saboroso em pratos de várias culturas. Embora o Hemisfério Norte concentre a maior diversidade de fungos silvestres - muitos deles apreciadíssimos, como as trufas -, vários são cultivados há mais de 300 anos em outros pontos do planeta. Entre os mais comuns estão os cogumelos-de-paris, chamados assim por terem sido amplamente cultivados na cidade francesa no século 19. Consumido geralmente fresco, é um dos mais versáteis. Shiitake e shimeji são bastante apreciados em pratos orientais. Desidratados, concentram aroma e sabor. Mas nas três receitas que ilustram esta edição, Sauro Scarabotta, do restaurante italiano Friccò, em São Paulo, recomenda utilizá-los frescos.

Polenta fresca com shimeji, lingüiça e quiabo

Ingredientes

1 kg de fubá
1 litro de água
100 g de manteiga
300 g de shimeji fresco picado
300 g de lingüiça fresca fina
150 g de quiabo
2 dentes de alho, cortado ao meio, sem miolo
1 lata de tomate pelado
2 copos de vinho branco seco
1 cebola picada
250 g de parmesão ralado
12 tomates maduros sem pele e sem sementes, picados
azeite o quanto baste
leite o quanto baste
sal a gosto

Preparo

Coloque a água da polenta para ferver. Misture o fubá com um pouco de leite frio (até ficar cremoso como mingau) e acrescente-o, aos poucos, à água (isso evita que ela empelote e torna seu cozimento mais rápido). Salgue e deixe cozinhar por 50 minutos em fogo baixo, mexendo sempre. Separadamente, refogue o shimeji com azeite e metade do alho. Reserve. Corte o quiabo em rodelas e escalde de 2 a 3 minutos em água fervente para perder a baba. Escorra. Refogue o alho restante em azeite e junte o quiabo, refogando por alguns minutos. Reserve. Grelhe a lingüiça e corte em rodelas. Refogue a cebola em azeite, junte o tomate pelado, os tomates e deixe cozinhar por 20 a 25 minutos. Em uma frigideira com azeite, refogue rapidamente as rodelas de lingüiça e junte o vinho branco. Quando evaporar, acrescente o refogado de tomates e o de cogumelos. Quando a polenta estiver pronta, desligue o fogo, acrescente a manteiga para dar mais gosto e junte o quiabo. Acerte o sal.

Montagem

Coloque a polenta no prato, abra um buraco no centro e disponha o molho. Polvilhe o queijo ralado por cima.

Dica do chef se preferir, prepare a polenta com um pouco de antecedência e cubra-a com papel-filme, deixando-a em banho-maria até o momento de servir

rendimento
8 a 12 porções
preparo 1h30