quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Que viván los tamales!


Cidade do México - quarto dia

istock photo
Um dia, ganhei um livro de um importante pesquisador norte-americano, Jeffrey Pilcher, que discutia a importância da cozinha como formadora de identidades nacionais, tendo como estudo de caso o México e um de seus grandes símbolos alimentares - os tamales. Lendo Que viván los tamales!, não conseguia compreender essa comida diante da infinidade de pratos e preparações derivadas do milho, um dos quatro pilares da cozinha mexicana desde sempre (ao lado dos frijoles, dos chiles e do cacau).

Pois em minha segunda noite na Cidade do México pude espiar um pouco deste universo que são os tamales e suas variações por todo o país. Lourdes levou-me ao primeiro Laboratório do Gosto (em 2009) - como se chamam os encontros periódicos dos adeptos do movimento Slow Food em todo o mundo. Naquela noite, o tema do encontro versava sobre os tamales.

Tamales são, mais do que as tortillas, um símbolo de identidade entre os mexicanos. Tamal significa "envolto cuidadosamente", e é uma espécie de pamonha sofisticada: a base, feita de maíz (milho), leva tantos recheios quanto são os ingredientes da cozinha mexicana; depois de misturada à banha de porco, caldo de carne ou água, a massa de maíz é embrulhada "cuidadosamente" e cozida em vapor.

São mais de 1.400 tamales descritos, que se diferenciam segundo as regiões do país, as diferentes folhas que os envolvem (de bananeira, do milho, de hierba santa etc.), as proporções de ingredientes (quando são recheados, por exemplo), o tamanho, o modo como são embrulhados, a maneira de preparar a massa de maíz. Há tamales que têm a espessura de um dedo (tamales porteños) e aqueles que alimentam até 300 pessoas (tamale zacahuil); há tamales recheados de carne, cogumelos, chiles, moles, verduras, frutos do mar, frutas, nozes, flor de abóbora e até mesmo doces. São consumidos no dia-a-dia, mas também em festas, dias santos, batizados.

Os homens não tocam na massa: todo o manejo do maíz é feito por mulheres. A eles cabe amarrá-los quando são grandes, como os zacahuil, tamal tradicional da região da região de Veracruz. Este é cozido em forno de barro, semelhantes aos de assar pães. Depois de aquecido, o forno é fechado com ladrilhos e com barro e o tamale é cozido durante toda a noite.

Foi um deste que provamos naquela noite, além de outros quatro: tamal borracho, que leva chile e carne de todas as partes do porco (principalmente a cabeça); o pibil pollo, da Península de Yucatán, mais firme, cozido em forno de barro e muito gostoso; o tamal de cazuela, ou seja, de "caçarola", típico de Veracruz e Tamaulipas, que leva mole e epazote (mastruz) e recheio de carne de porco ou frango, não se envolve em folha alguma, mas cozinha-se em uma caçarola de barro - foi o de sabor e textura mais delicados e meu preferido; e o tamal borracho em tamanho pequenino, com sabor defumado e massa mais seca.

São tradicionalmente acompanhados de uma bebida incrível - o atole, feito de maíz e água. O que tomammos aquela noite chama-se champurrado, uma variação do atole que leva cacau, muito consumida no centro do país.

Assim como muitas outras comidas prehispânicas, os tamales sobreviveram por 500 anos, a despeito dos esforços das classes governantes de europeizar o México, tentando substituir, por exemplo, o milho pelo trigo. em seu livro, Pilcher explica que, no século 20, essas comidas tornaram-se parte essencial da ideologia indigenista que emergiu após 1940, quando uma classe média urbana e crescente se apropriou das comidas nativas populares e elevou-as a símbolos da cozinha nacional. Que vivan los tamales!

3 comentários:

Anônimo disse...

Olá Cris! Que viagem, heim? Parabéns!
O México é um outro planeta. Quanta diversidade temos na América Latina...
Abraços!
Rubén Duarte

Elisa D. Teixeira disse...

Cris, os tamales são um dos meus pratos prediletos nos restaurantes mexicanos e tex-mex aqui de Dallas. Ainda faço uma viagem dessas para conhecê-los mais de perto.
Bjs,
Elisa D. Teixeira

Iza disse...

Olá! Voltei recentemente do México e de tudo que comi os tamales foram insuperáveis!!! Uma pena que no Brasil não tenha a farinha de milho destamalizada para fazermos alguns... mas vou tentar com farinha de milho branco... vamos ver no que dá! Abraços